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Anorexia e bulimia, doenças bem femininas

Por Julienne Gananian * em 10/12/2001


Obsessão por comida e um medo incontrolável de engordar. Conheça melhor a anorexia e a bulimia.

Vivemos numa época de culto ao corpo, em que a malhação e os regimes fazem parte da vida da maioria das pessoas, principalmente das mulheres. A busca pela boa forma surge durante a adolescência, junto às diversas inseguranças desta fase, se estendendo, muitas vezes, pela vida adulta. Os pais devem ficar atentos para que o medo de engordar não se transforme em doença: entre 1% e 3% das adolescentes sofrem de anorexia e a cada cem meninas, cerca de sete apresentam bulimia.


"Atualmente os valores que reforçariam a questão da força interna, da individualidade e da preocupação com os outros estão se transformando. Há um enaltecimento da forma em detrimento do conteúdo" afirma o Dr. Táki Athanassios Cordás, psiquiatra especializado em transtornos alimentares psiquiatra, Doutor e Mestre pelo Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. O padrão familiar, a estrutura psicológica e alguns fatores genéticos também se mostram significativos no desenvolvimento dessas doenças, que raramente atingem os homens.

Elas não sentem fome?

Quando se ouve falar nesses transtornos, muitos pensam que as doentes simplesmente não gostam de comida. Na verdade ocorre exatamente o contrário: inicialmente elas sentem forme, mas o medo de engordar transforma-se em algo incontrolável. Submetem-se, assim, a inúmeras estratégias para negar a fome, eliminar o que comeram e perder peso.


As anoréxicas possuem ainda uma visão distorcida do seu corpo e, ao se olharem no espelho, mesmo que já estejam retas e muito magras, se enxergam gordas. "O distúrbio da imagem corporal é tão impressionante que meninas com 30 ou 40 quilos, ou seja, em grave estado de desnutrição, com aparência cadavérica, descrevem-se como tendo quadris enormes ou coxas muito grossas" conta o Dr. Cordás.



O sofrimento de um pai


"Nossa filha Paula era uma jovem normal, morena, alegre e bonita. Após uma cirurgia para a redução das mamas, começou a se gostar mais e isso nos trazia muita satisfação. Paralelamente, Paula iniciou um processo de anorexia, achando que, se ficasse mais magra, poderia, quem sabe, ser uma modelo no futuro. Durante um dia inteiro se alimentava com uma cenoura, um pepino ou um pedaço de melancia. Quando notamos que ela estava perdendo peso muito rapidamente, procuramos um psiquiatra amigo e ele iniciou um tratamento.


Ela continuava emagrecendo, e em certa ocasião descobrimos que o pouco que comia, ela devolvia (induzindo vômitos), o que caracterizava também uma bulimia. O médico queria internar nossa filha, mas ela nos convenceu a trocar a internação por um tratamento rigoroso em domicílio. Sua alegação era de que não poderia perder as provas do primeiro bimestre do Direito, curso recém-iniciado.


O tratamento foi seguido à risca, mas talvez tenha sido em vão. Paula tinha o hábito de ficar na Internet ou vendo TV até altas horas da noite, e nós tínhamos de ir dormir por causa do trabalho no dia seguinte. Tenho quase certeza de que ela ingeria os alimentos na nossa frente e os devolvia na primeira oportunidade que tivesse.


O certo é que no dia 20 de maio de 1999 ela não acordou mais. Na noite anterior, tinha ido à faculdade e chegado em casa por volta das 23h, muito feliz e contente. A "causa mortis" possível e não-confirmada foi uma hipoglicemia com parada cardíaca. Hoje sei que, se tivéssemos mais conhecimento sobre as doenças, talvez Paula pudesse estar conosco para festejar seu aniversário de 20 anos."


Carlos Alberto Peixoto, Dourados (MS). carlospeixoto@terra.com.br

O dia-a-dia

As anoréxicas em sua maioria são mulheres dinâmicas, inteligentes e bonitas. Passam o dia estudando, exercitam-se incessantemente, param de menstruar e desenvolvem rituais obsessivos relacionados à comida. Escondem alimentos nos armários, banheiros ou dentro das roupas, tudo para não terem que comer. Em muitos casos adoram cozinhar e servir comida para os outros ao mesmo tempo em que diminuem, cada vez mais, o consumo de alimentos. Empregam diversas técnicas para se pesar ou medir, além de se olharem no espelho incessantemente, procurando as "gordurinhas" que na verdade não existem.


"Aos 14 anos comecei a me interessar por atividades físicas e a capoeira foi minha grande paixão. Passei a cortar do meu cardápio refrigerantes, doces, frituras, até chegar a uma alimentação cheia de saladas e frutas. Fazia exercícios todos os dias, levava uma vida perfeitamente saudável, né?Todos que viam à distância pensavam isso, mas quem estava perto já podia notar que algo estava errado. Eu não me permitia comer nada além do que achava ser o correto, nem um pedaço de chocolate, um picolé de fruta ou um brigadeiro. NADA" conta Joyce Peu, de 21 anos, ainda em fase de tratamento.


As bulímicas entram, também, em dietas rigorosas, exercitam-se excessivamente, abusam de laxantes e de diuréticos ou ingerem moderadores de apetite, porém fazem isso para compensar o chamado "episódio bulímico". Nesses momentos comem compulsivamente alimentos muito calóricos, chegando a ingerir até 20.000 calorias de uma só vez.


"Nessas ocasiões não se importam com o gosto ou a textura do alimento. Ingerem arroz doce, leite condensado, pizza, feijão, batata, sorvete, tudo isso de pé, na cozinha ou escondida, a qualquer hora" explica o psiquiatra. O comportamento que mais chama a atenção, presente em praticamente 95% dos casos de bulimia, é o ato de forçar o vômito após este episódio. Se não conseguem vomitar, os doentes se sentem sujos por dentro e estufados.

Procure ajuda

O Dr. Táki Cordás conta que as meninas que sofrem de anorexia geralmente vão "na marra" ao consultório, trazidas pelos pais contra sua vontade. Já as bulímicas procuram tratamento voluntário, pois se sentem mal, envergonhadas ou com medo. "Muitos pais me ligam descrevendo sintomas de anorexia em suas filhas e dizem que tentam conversar e convencê-las, mas elas falam que estão bem, que não querem ir ao médico. Eu explico que, no caso da anorexia, é como se fosse uma criança que não quer ir a um pediatra e está com pneumonia: não há convencimento, tem que tratar de qualquer forma" explica.


O apoio dos amigos e parentes mais próximos neste momento é fundamental. Todos devem colaborar, aprender a lidar com a pessoa que está sofrendo e, caso seja necessário, participar de uma terapia para a reorganização da dinâmica familiar. O tratamento das doenças engloba diversas áreas médicas, como psiquiatria, endocrinologia e, em muitos casos, a paciente deve ser internada.
"No final esperamos que a garota fique mais satisfeita com as suas qualidades e possibilidades, se relacionando melhor com amigos e familiares e aprendendo a lidar bem com as questões do corpo e do peso" afirma o psiquiatra.


"Faço minhas refeições em outros lugares, pois ainda acho que se trouxer comida pra dentro de casa, comerei tudo de uma vez. Venho batalhando para voltar a ter prazer na vida, a fazer as coisas que gosto com um pensamento certo, não obsessivo. Tenho fé que as coisas melhorarão aos poucos e que sairei dessa mais fortalecida e confiante" conclui Joyce Peu.


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