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A integração dos diferentes
Por Lucy Casolari
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Seu filho chega da escola chorando por ter sido excluído de uma brincadeira. Questionado sobre o incidente, aparece a marcação cerrada contra os gordinhos, sardentos...
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Situações desse tipo causam preocupação e mágoa aos pais que, se obedecerem ao seu primeiro impulso, tendem a dar broncas nos companheiros dos filhos, tomar satisfações na escola ou, pior ainda, com os outros pais. Dentro do espaço escolar, eventos desse tipo ocorrem com freqüência, pois é o local de encontro de crianças vindas de diversas famílias, cada uma com suas peculiaridades físicas, emocionais, raciais, étnicas, etc., enfim, o espaço da socialização.
As queixas do filho sobre suas dificuldades de integração trazem para os pais uma carga pesada, mescla de sentimentos contraditórios de revolta contra aqueles que o discriminam e culpa pelas possíveis razões dessa exclusão. Por trás disso há o desejo de proteger a criança de sofrimentos e, ao mesmo, a expectativa de que seu caminho seja somente de flores, sem nenhum espinho...
Como lidar com as dificuldades
É bom lembrar que as crianças são implacáveis, terríveis para descobrir o ponto fraco dos outros e atacá-lo, sem dó nem piedade. Se alcançam sucesso, então é um prato cheio! Esse lado cruel, que deve ser trabalhado na infância, explica certas atitudes tais como: os apelidos pejorativos - baleia, quatro-olhos, ferrugem, varapau, girafa... - e as piadinhas maldosas a partir das diferenças raciais e étnicas. Quando os pais colocam o filho, alvo dessas gozações, na condição de coitadinho, fica ainda mais difícil para ele se defender construtivamente e se integrar ao grupo.
A superproteção da família traz, embutida em si, a falta de confiança na sua capacidade. Assim, é fundamental que a criança seja apoiada pelos pais, por um lado, mas incentivada, também, a lidar com a situação. Isso não significa que se espere que consiga resolver tudo sozinha, ao contrário, sua ajuda será necessária para que ela possa dominar a raiva e enfrentar a agressividade dos colegas, evitando que tudo isso se transforme em um fardo pesado demais.
Colocar toda a responsabilidade pelas dificuldades de seu filho nos outros - colegas inconvenientes, inabilidade da professora ou da escola - não resolve a questão, que é delicada e, com certeza, causa angústia e sofrimento. Procure enxergar com objetividade - claro, a maior possível dentro desse contexto - e apóie seu filho para fortalecer a auto-estima. Muitas vezes essas maldades dos outros atingem a família porque expõem algo que também a incomoda, ou que não é aceito como parte intrínseca de sua criança. Pode ser, por exemplo, o caso da mãe "saradíssima" que não consegue transformar a filha gordinha em uma menina dinâmica e esportista...
Em nossa sociedade convivemos com padrões estéticos e estereótipos, verdadeiras "fôrmas" nas quais deveríamos nos encaixar a todo custo, a qualquer preço! E aí... quem não obedece a esse figurino sofre discriminação. A questão da aparência toma, muitas vezes, uma proporção descabida em detrimento dos valores, pois as pessoas são avaliadas por seu aspecto exterior e pelos bens que possuem. Fique atento, inclusive, se você mesmo, até sem perceber, não está passando mensagens com duplo sentido ao analisar as outras pessoas por padrões distorcidos. Afinal, quem não tem algum preconceito?
Na escola se aprende a conviver
Ao se dar conta de que seu filho está passando por dificuldades de integração é importante que você entre em contato com a escola para dimensionar corretamente a extensão do problema. Os profissionais poderão lhe dar dicas sobre o que acontece de fato e sobre a maneira como lidam com as atitudes de preconceito que surgem na relação entre as crianças e grupos.
É importante verificar qual é posicionamento da escola a esse respeito, pois à instituição cabe administrar e interferir nessas dinâmicas e promover o desenvolvimento da tolerância. Ao receber os mais diferentes alunos, conta com a riqueza da diversidade, há de tudo: altos e baixinhos, gordos e magros, os aplicados e os nem tanto, os ases do futebol e os que não querem chegar perto da bola e, ainda, os que usam a roupa de grife do momento e os que não a têm... Além disso, convivem os diversos sotaques de norte a sul, as diferentes raças e etnias, e, se a escola não for confessional, pode-se ter várias religiões.
Trata-se, portanto, de um espaço privilegiado para ensinar a conviver. Para isso a escola precisa, em primeiro lugar, reconhecer a existência de conflitos entre as crianças ou grupos. A partir daí é desejável e esperado que ocorram as intervenções, se estabeleçam limites claros para garantir espaço para todos, sem discriminação. É assim que se ensina convivência e tolerância - na prática - e não com discursos moralizantes.
Quanto mais cedo melhor
Se seu filho está tendo dificuldades de integração por se sentir amedrontado ou sofrendo pressão de algum grupo ou colega, procure a ajuda da escola. Quanto antes essas questões forem identificadas e resolvidas melhor, pois crianças são menos preconceituosas que adolescentes. É na infância, portanto, que esse trabalho deve ser iniciado, mas de modo algum, embora bem mais difícil, pode ser interrompido na fase posterior.
A postura da escola é fundamental para que não se cristalizem visões equivocadas que podem dar origem a grupos fechados e poderosos, responsáveis pela exclusão e rejeição dos chamados "diferentes" a partir dos motivos mais banais, trazendo ainda a explosão da violência dentro do espaço escolar.
Se a família estiver atenta e tiver confiança na filosofia da escola e na atuação de seus profissionais é provável que a integração do seu filho ao grupo, embora mais complicada, acabe sendo satisfatória. Entretanto, se você sentir que, apesar dessa parceria, os resultados não tenham sido alcançados, procure buscar a orientação de um especialista que poderá, ao analisar o caso com maior profundidade, encontrar pistas e traçar diretrizes para ajudar seu filho e toda a família.
* Lucy Casolari é pedagoga e educadora